Márjole Coletro
Charlie Chaplin, carros e status quo: as diversas faces do controle produtivo. Todo processo produtivo, seja industrial ou de manufatura, possui desafios para tornar a produção enxuta e eficiente para o negócio. Existem inúmeras questões que precisam ser levadas em consideração para, por exemplo, evitar desperdícios e prejuízos ou otimizar processos. Entre elas é possível destacar: controle de linha de produção, cumprimento de prazos, gestão de estoque e de fornecedores, qualidade do produto, entre outros. Além disso, é importante entender que todas essas questões estão suscetíveis às mudanças tecnológicas e do mercado. Para entender melhor, vale a pena recapitular um pouco das evoluções pelas quais a indústria passou.
Da Revolução Industrial ao Fordismo
Não é novidade que a Revolução Industrial mudou, não apenas a forma de se produzir, mas também a de se consumir e as relações entre as pessoas no mundo. Afinal, a humanidade mudou mais em 100 anos do que em todo o período anterior desde a antiguidade.
Acompanhando a evolução tecnológica, as metodologias de administração também tiveram que ser aprimoradas à medida que as necessidades iam mudando e se tornando mais complexas.
Quando Henry Ford começou a fabricar carros em massa através de uma linha de montagem automatizada e esteiras rolantes, sua preocupação era aumentar a produtividade a um custo tão baixo, de forma que o maior número de pessoas pudessem ter um carro.
No entanto, diminuir o custo do processo produtivo trouxe consequências para o produto, como por exemplo a alta padronização e a simplificação.
Quem nunca ouviu a célebre frase “seu modelo Ford T pode ter qualquer cor desde que seja preto”? Com certeza, já viu também as críticas a esse modelo no famoso filme Tempos Modernos de Charlie Chaplin.
Nos primórdios do fordismo, algumas preocupações que hoje são imprescindíveis não eram consideradas impactantes para aquele mercado. Ford não estava preocupado com o limite da demanda. Tampouco as pessoas ficavam incomodadas dos seus carros serem parecidos.
Apenas a existência de carros acessíveis já era suficiente para mudar consideravelmente a sociedade da época.
Nesse contexto, autoestradas foram construídas e outros setores manufatureiros foram beneficiados com a tecnologia desenvolvida pelo setor automobilístico. Mas, os anos dourados da Ford inevitavelmente entraram em declínio.
Flexibilização e diversificação
Com o mercado em transição, a General Motors acabou por flexibilizar sua produção e seu padrão de gestão. O resultado foi o lançamento de diversos modelos de veículos, de várias cores e adotou um sistema de gestão profissionalizado, baseado em colegiados.
Com isso, a GM ultrapassou a Ford e se tornou a maior montadora do mundo. No novo contexto, não bastava produzir em grande escala, era preciso produzir com diversidade de modelos, produtos, cores, versões e tudo que possa agregar valor.
Seguindo a tradição de que as grandes transformações na engenharia da produção surgiram na indústria automobilística, logo temos a Toyota propondo um modelo de produção enxuta, que busca eliminar os desperdícios e produzir com o mínimo de estoque possível.
A empresa, então, agrega valor diminuindo seus custos e ganhando eficiência na linha de montagem.
O Volvismo vem em seguida, trazendo um destaque maior para a gestão da qualidade em todas as etapas do processo.
Assim, como mostra a história, por meio da evolução da indústria automobilística, a metodologia do controle de produção foi ganhando corpo desde que Taylor desenvolveu suas teorias da administração científica.
O mundo também mudou: As pessoas não querem mais ser padronizadas e há uma busca por originalidade e exaltação do status quo. Quem não percebeu essa nova realidade ficou obsoleto.
Como controlar a produção?
Hoje, nesse novo cenário de flexibilização e diversificação, o desafio das empresas é identificar quais controles podem ser úteis para sua realidade e, em meio a tantas escolas da administração, esse pode ser um grande desafio.
Para otimizar essa escolha, vamos considerar alguns critérios primordiais que devem ser levados em conta e metodologias simples que podem ser aplicadas em diferentes realidades.
1 – TIPO DE PRODUTO
Um dos critérios importantes para essa análise é o tipo de produto que a empresa entrega.
Empresas de commodity por exemplo, trabalham com produtos padronizados e não precisam de uma linha de produção diversificada.
Para muitos produtos como cereais, minérios ou açúcar, a produção em esteiras iniciada tempos atrás com Ford ainda é uma boa opção.
Já grifes de moda de alto padrão têm como principal característica a exclusividade e a alta qualidade de seu processo produtivo e de suas matérias-primas.
Nesse caso, é importante trabalhar com um estoque enxuto, devido ao alto custo dos materiais e uma linha de produção celular, que permite a alta diversidade de modelos.
O modelo de produção escolhido é apenas a ponta do iceberg. Para garantir uma produção controlada e eficiente, é preciso pensar em, no mínimo, três pilares: estoque, prazos e qualidade.
2 – ESTOQUE
Basicamente, os estoques podem ser de quatro tipos: estoque de proteção, estoque de ciclo, estoque de antecipação e estoque de canal.
O estoque de proteção tem como objetivo compensar demandas acima do esperado e maior que o tempo de reabastecimento. Além disso, ele compensa incertezas no fornecimento. É uma segurança da empresa para eventos inesperados e não deve ser muito grande, pois serve para tratar exceções.
O estoque de ciclo ocorre principalmente nas empresas que operam com vários produtos ou em operações que possuem vários estágios. O planejamento de pedidos do estoque nesse caso deve seguir o planejamento de vendas garantindo que haja produtos de acordo com a prioridade da linha de produção.
Já o estoque de antecipação tem como objetivo suprir uma grande demanda futura prevista nas vendas da empresa e funciona bem em empresas que possuem alta sazonalidade.
O último tipo que consideramos, é chamado estoque de canal e é um tipo intermediário. Está em trânsito entre o fornecedor (fabricante) e o varejista. Seu controle é muito importante especialmente no que diz respeito ao monitoramento de carga.
3 – PRAZOS
O cronograma produtivo deve ser seguido à risca e suas premissas devem ser claras. Uma dica importante nesse caso, é que o cronograma da produção leve em conta o cronograma de vendas para evitar que haja falta de produtos na entrega ao varejista ou consumidor final. Assim, os produtos que saem primeiro são vendidos primeiro.
Como auxílio a essa produção puxada é interessante que a empresa aplique o Kanban, uma ferramenta utilizada no Toyotismo e que é basicamente um cartão de sinalização que controla os fluxos de produção ou transportes em uma indústria.
Sua principal característica é a capacidade de agilizar o deslocamento do produto entre os setores e evitar gargalos por falta de material. Ou seja, além de ganhar agilidade, o Kanban auxilia no controle de estoque na medida em que as necessidades de reposição são identificadas visualmente.
4 – QUALIDADE
O último grande pilar é o controle de qualidade dos processos e do produto final. Este controle é considerado um pilar pois diminui o retrabalho e, automaticamente, gera uma redução da utilização de matéria-prima e garante o cumprimento dos prazos. Ou seja, auxilia o funcionamento dos demais.
O controle de qualidade dentro das empresas é um mundo à parte, com suas próprias metodologias e evoluções que divergem dependendo do tipo e porte da indústria.
Mas, algumas premissas podem ser levadas em conta independente dessas características. Uma dica para o controle da qualidade, é a aplicação de checklists de verificação no final de cada processo. Esta é uma maneira de institucionalizar a verificação por setor e permitir o controle de peças defeituosas.
Além dos pilares citados, outros fatores podem e devem ser levados em conta, de acordo com o tipo de negócio como, por exemplo, a capacidade produtiva, os equipamentos e a mão de obra disponíveis.
E, lembre-se: assim como a tecnologia, a gestão da produção está sempre evoluindo.
Mantenha-se atualizado, foque nos resultados sem esquecer de controlar os processos e garanta sua existência e ganhos em um mercado cada vez mais competitivo, diversificado e que está em constante evolução.